O estudo reĂșne informações sobre o acesso da população à educação infantil, que vão auxiliar na criação de um plano de ação voltado à expansão da oferta de vagas nessa etapa de ensino no paĂs.
As conclusões do estudo, realizado entre 18 de junho e 5 de agosto, foram divulgadas na terça-feira (27).A educação infantil, com o devido acesso a creches e pré-escolas de qualidade, é um direito de todas as crianças, e a oferta de vagas é obrigação do poder pĂșblico, ambos previstos na Constituição Federal de 1988 e ratificado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2022.
As creches são destinadas às crianças até os 3 anos de idade, ou que tenham 4 anos, se completados após 31 de março de cada ano, data que estabelece o corte etĂĄrio para ingresso na pré-escola.
Na pré-escola, a frequĂȘncia é obrigatória para crianças de 4 e 5 anos de idade ou que tenham 6 anos, completados após 31 de março, quando a criança deve ingressar no ensino fundamental.
Todos os 5.569 municĂpios e o Distrito Federal responderam ao levantamento nacional Retrato da Educação Infantil no Brasil - Acesso e Disponibilidade de Vagas, feito em 48 dias.
Dos municĂpios, 2.445 (44%) tĂȘm fila de espera nessa etapa; 7% não fizeram essa identificação de falta de vagas; e 184 (3%) não tĂȘm creche, segundo o Censo Escolar da Educação BĂĄsica de 2023.
Ao considerar exclusivamente o total de cidades com filas de espera em creches, 88%, 2.160 cidades, relatam que o principal motivo é a falta de vagas.
Na pesquisa, como os municĂpios puderam marcar mais de um motivo pelos quais os responsĂĄveis não matricularam suas crianças em creches, aparecem outras explicações, como opção dos pais, por entender que as crianças são pequenas demais para ir à creche ou que a primeira infância deve ser vivida em famĂlia; desconhecimento sobre o processo de matrĂcula e de prazos; distância entre a residĂȘncia e a instituição de ensino; falta de transporte adequado, especialmente, em ĂĄreas rurais; incompreensão sobre a importância da educação infantil; mudanças frequentes de endereço da criança.
No registro total das mais de 632,7 mil crianças na fila por vaga em creche por faixa etĂĄria, 123 mil (19%) tĂȘm até 11 meses de idade; 178,4 mil (28%), 1 ano; 165,4 mil (26%) tĂȘm 2 anos; 131,4 mil (21%) tĂȘm 3 anos; e 34,3 mil (5%), 4 anos.
Entre as regiões, o Sudeste tem 212,5 mil crianças fora de creches. A região é seguida pelas crianças do Nordeste (124,3 mil); Sul, com 123,3 mil crianças desassistidas; Norte, 94,3 mil; finalizando com o Centro-Oeste, 78,1 mil crianças sem vagas em creches.
Sobre a pré-escola, em nĂșmeros absolutos hĂĄ 78.237 registros de crianças que não frequentam essa etapa de ensino, sendo que 50% (39.042) estão nessa situação porque a rede não tĂȘm vagas.
Em relação aos municĂpios, na faixa etĂĄria relativa à pré-escola o percentual de crianças que deveriam estar matriculadas é 8%. As principais razões são a não realização da matrĂcula pelos responsĂĄveis, em sete de cada dez desses municĂpios; e a falta de vagas, em quatro de cada dez.
No Brasil, apenas 11% dos municĂpios iniciam o atendimento das crianças em creches sem prever idade mĂnima para ingresso. Nos demais, hĂĄ idades estipuladas: 52% começam a atender bebĂȘs entre 1 mĂȘs e 11 meses; 22%, crianças entre 1 ano e 1 ano e 11 meses; 11% entre 2 anos e 3 anos incompletos; e 3% atendem apenas a partir dos 3 anos de idade.
No paĂs, 44% dos municĂpios tĂȘm critérios de priorização do atendimento em creches, enquanto 56% ignoram essas condições.
O principal parâmetro levado em conta pelas redes de educação pĂșblica (64%) é a situação de risco e vulnerabilidade, que se refere, especialmente, a crianças encaminhadas por órgãos como o conselho tutelar, assistĂȘncia social e Ministério PĂșblico.
Outros fatores mais apontados para a definição de ordem na fila por vaga em uma creche são crianças com deficiĂȘncias, transtornos globais do desenvolvimento e necessidades educacionais especiais, como altas habilidades ou superdotação (48%); responsĂĄveis que trabalham fora (48%) no perĂodo de aula; famĂlias de renda familiar (38%), particularmente aquelas inscritas no Cadastro Ănico para Programas Sociais do Governo Federal (CadĂnico) ou beneficiĂĄrias do Bolsa FamĂlia; mães solo e/ou mães adolescentes (23%), especialmente, aquelas que estudam ou trabalham; proximidade da residĂȘncia (17%); encaminhamentos especiais (9%) determinados judicialmente ou por órgãos de proteção; ordem de inscrição na lista de espera (6%); demais ocorrĂȘncias (7%), como a presença de irmãos matriculados na mesma instituição, mães que trabalham em ĂĄreas rurais e crianças em situação de acolhimento institucional.
Os municĂpios são obrigados a divulgar a lista por vagas nos estabelecimentos de educação bĂĄsica de sua rede de ensino, conforme determina a Lei 14.685/2023. No entanto, apenas 25% dos municĂpios tornam pĂșblico o nĂșmero de vagas existentes em creches, aponta o estudo.
Outros dados divulgados no levantamento são as ações municipais para garantir a matrĂcula e frequĂȘncia de crianças em idade pré-escolar que estão fora das salas de aula: 68% das prefeituras fazem a busca ativa de crianças, mas as famĂlias não procuraram atendimento, incluindo visitas domiciliares, campanhas de conscientização e parcerias com conselhos tutelares, assistentes sociais.
As ações ainda incluem a divulgação de campanhas de conscientização e sobre o perĂodo de matrĂculas em redes sociais e outros meios de comunicação; o uso de sistemas informatizados e cruzamento de dados para identificação de crianças fora da escola; e por fim, planos de ampliação de salas de aula e a criação de vagas adicionais para atendimento do pĂșblico alvo.
Em resposta aos desafios difundidos no levantamento, o Ministério da Educação (MEC) disse que, desde o inĂcio da atual gestão, tem investido na educação bĂĄsica em todo o Brasil, com ĂȘnfase na ampliação das vagas e na qualidade da oferta. Até 2026, o MEC planeja construir 2,5 mil novas creches e pré-escolas por meio do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Além do Novo PAC, o Pacto Nacional pela Retomada de Obras da Educação BĂĄsica pretende concluir todas as obras paralisadas e inacabadas da educação bĂĄsica.
A secretĂĄria de Educação BĂĄsica do MEC, KĂĄtia Schweickardt, informou que foram investidos mais de R$ 1 bilhão na educação infantil. "Desde 2023, foram R$ 592 milhões investidos pelo Programa Escola em Tempo Integral, nessa etapa educacional; outros R$ 492 milhões investidos pelo Programa de Apoio à Manutenção da Educação Infantil e, ainda, R$ 93 milhões aplicados no Programa Leitura e Escrita na Educação Infantil. Além disso, jĂĄ entregamos 378 novas creches".
O secretĂĄrio de Articulação Intersetorial e com os Sistemas de Ensino, do Ministério da Educação, MaurĂcio Holanda, defende a atuação conjunta da União, estados e municĂpios para traçar um plano de ação.
"Temos realizado, no MEC, uma grande tarefa de construir relacionamentos interfederativos cada vez mais sólidos. Precisamos pensar o que podemos fazer com e pelos municĂpios no enfrentamento desse cenĂĄrio", disse.
A presidente executiva do Instituto Articule, Alessandra Gotti, comentou os principais desafios a serem enfrentados imediatamente para reversão dos nĂșmeros negativos. "Um plano de apoio aos municĂpios precisa olhar para a universalização, urgente, da pré-escola. Além disso, é preciso construir um plano de expansão de vagas de creche, de forma a atender toda a demanda existente. Havendo lista de espera, priorizar de imediato as crianças que mais precisam de maneira a reduzir as desigualdades sociais".
O conselheiro da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), Cezar Miola, enfatizou a necessidade de conhecer os dados para que diferentes instituições auxiliem os municĂpios. "Não se controla o que não se conhece. Precisamos acessar esses dados, para que possamos atuar em cada rede."